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Pequenas Coisas Como Estas

Os medos de um pai vigilante

Por Larissa Reis



“A maioria das garotas vem aqui grávidas, algumas dos próprios pais. Bridget ganhou essa barriga do seu pastor da paróquia. Estamos tentando deixar as coisas brancas como a neve. Todas nós, filhas infelizes”. Este trecho de The Magdalene Laundries, canção de Joni Mitchell, poderia perfeitamente estar entre as falas do filme Pequenas Coisas como Estas.  

Ambientado na Irlanda em 1985, o longa-metragem apresentado na abertura do 74º Festival de Berlim começa e termina com o som dos sinos de uma igreja. A primeira vez que você ouve os sinos, eles transmitem a atmosfera daquela cidade fria e humilde, com seus habitantes ocupados se preparando para o Natal. Porém, ao ouvi-los no final, eles soam muito diferentes, como um lembrete no ar do domínio da Igreja Católica e da vergonhosa tradição irlandesa.


A história, que ganhou produção de mãos talentosas como as de Ben Affleck, Matt Damon e Cillian Murphy, gira em torno de Bill Furlong, vivido pelo próprio Cillian. Ele é um respeitável comerciante de carvão e madeira, pai de cinco filhas e dono de um coração gentil, mas de comportamento taciturno e totalmente pacato. Bill esconde um passado traumático, motivo pelo qual desenvolve especial empatia pelas meninas que são trazidas para o convento local. Mas toda a pressão e medo da situação o fazem ficar em silêncio, alheio a qualquer envolvimento, para que a igreja não interfira no seu negócio e na sua família. Tudo isso resultando em uma atuação de longos olhares e respiração pesada de Cillian.  


Pequenas Coisas Como Estas é baseado no livro homônimo de Claire Keegan, que conta a história real das Lavanderias de Madalena, que nada mais eram do que conventos disfarçados de asilos, onde meninas “perdidas” eram levadas a força para “lavar” seus pecados. Só que, na verdade, as jovens que ali se encontravam eram obrigadas a trabalhar de maneira forçada, em condições análogas à escravidão. Eram elas prostitutas, jovens que engravidavam antes do casamento, meninas sem apoio familiar e até mesmo aquelas que sofreram violência sexual. Em alguns casos, eram presas também pelo simples fato de serem bonitas, “paqueradoras” ou “sedutoras” demais. Então, os bebês que ali nasciam eram colocados para adoção, muitas vezes contra a vontade da mãe, porém, eles davam um bom lucro a essas instituições. 


Livro e filme nos colocam em contato com esta chocante realidade, só que na versão cinematográfica o roteiro vai no sentido contrário, ao explorar o silêncio ensurdecedor em torno do escândalo da época. O diretor Tim Mielants coloca o filme diretamente nos ombros de Murphy e o deixa definir o ritmo, às vezes lento, mas também muito poderoso. Uma performance, extremamente expressiva e, ainda assim, profundamente introspectiva. Apesar da chuva e do frio, o quieto e reservado homem do carvão ainda encontra alguma força e calor para oferecer.


Voltando aos sinos, agora eles já não soam como um chamado para a oração ou uma alegre expressão de fé. Em vez disso, cada badalada parece um aviso: "Lembre-se, estamos sempre observando!"


Confira o trailer




Pequenas Coisas Como Estas | Estreia 13.03.2025 | Dir. Tim Mielants | Irlanda/Bélgica/EUA | Suspense/Drama 98 min.

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